Recados para o novo Governo: aumentar a receita ou reduzir a despesa?
1. É muito difícil falar em redução da despesa pública se pensarmos em  duas das suas vertentes: a despesa social e a despesa corrente primária.
A despesa social é uma das prerrogativas existenciais do modelo de  Estado em que vivemos, com tarefas definidas, que extravazam a mera  garantia da segurança nacional, própria de um Estado Liberal oitocentista.
A despesa corrente primária representa, pura e simplesmente, a  existência de um Estado, que pratica actos próprios como entidade  personificada e que modifica as suas opções consoante o tipo de  circunstância com que se depara.
2. Presentemente, a sustentabilidade de médio e de longo prazo das  finanças públicas portuguesas está totalmente dependente dos  compromissos assumidos no âmbito do Pacto de Estabilidade e Crescimento  (PEC), ou seja, da convergência das políticas financeiras para o défice  zero, com consequências negativas no crescimento económico de cada um  dos países europeus. Actualmente faz mais sentido defender perante as  instâncias comunitárias uma revisão do PEC, promovendo a substituição da  obrigatoriedade de prossecução de políticas de défice zero pela  necessidade de tolerância de níveis orçamentais deficitários, desde que  uniformes e constantes, em nome do funcionamento dos multiplicadores do  investimento e da despesa.
Aliás, a recente revisão da Lei de Enquadramento Orçamental (Lei  91/2001, de 20/8), em finais de Agosto de 2004, veio consagrar a  necessidade de revisão interna do Programa de Estabilidade e Crescimento  pelo Governo e pela Assembleia da República.
3. O nível do défice português de 5% por referência ao PIB, descontadas  as medidas extraordinárias adoptadas não é totalmente preocupante,  porquanto representa a necessidade de o Estado prosseguir as suas  tarefas. Repare-se que na década de 80 e inícios de 90 os níveis do  défice das contas públicas eram muito superiores, sem que isso, no  entanto, não impedisse a manutenção de um nível de crescimento económico  nacional.
Não obstante, as políticas deficitárias para serem eficientes têm de  estar inseridas no orçamento elaborado numa lógica de gestão por  objectivos e não num mero orçamento circunscrito aos problemas anuais,  isto é, um orçamento de caixa. A gestão por objectivos exige, porém, a  elaboração de orçamentos plurianuais, muito para além dos mapas XV a  XVII da nossa Lei do Orçamento que, alternativamente, encarem as despesas:
a) numa perspectiva rígida, propondo políticas concretas a serem  executadas num período pré-definido de anos;
b) numa perspectiva deslizante, sem necessidade de proposta de políticas  concretas, mas projectando em períodos de anos identificados (de 3 em 3  anos, por exemplo) os resultados das políticas financeiras, tal e qual  como vem sucedendo com o modelo financeiro espanhol e francês.
4. Finalmente, para aumentar a receita faria todo o sentido o Estado  intensificar as relações com os contribuintes:
a) pela maximização do princípio da equivalência, visível através de  tributos no qual resulte uma reciprocidade de prestações (como as taxas);
b) pela solidificação de um conjunto de incentivos fiscais contratuais  (como aqueles que existem relativamente ao investimento estrangeiro),  substituindo, assim, o sistema de benefícios fiscais automáticos e  dependentes de reconhecimento administrativo, que só vêm complicar o  sistema fiscal, contrariando a possibilidade de planificação prévia pelo  contribuinte.
Guilherme Oliveira Martins | sexta-feira, janeiro 07, 2005 |  
	
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